[Rank D] Sediento - Infortúnio Acidente

Era curioso ao meu olhar como a ignorância é uma bênção na vida humana, desconhecendo que na realidade sempre existe um mal ainda pior que conhecemos. Estava nadando pelo rio sob a ponte de Karakura quando ouvi o estrondoso som de impacto, de início até eu fiquei confuso, mas assim que um pneu caiu da ponte e mergulhou nas águas escuras a verdade surgiu claramente. Um trágico acidente acabara de acontecer.
Nadei de imediato até uma das colunas e encravando minhas garras comecei a escalá-la até chegar no topo de onde possuía uma ampla visão do acidente, se ainda houvesse algum coração em minha alma talvez aquela cena me causasse alguma compaixão ou piedade sobre aquelas vítimas, contudo, nada me restava e tudo demonstrava ser apenas o puro e singular caos.
De alguma forma uma carreta capotara e rolara por cima de uma dúzia de veículos, todos monstruosamente esmagados pelo peso excessivo da carga, com isso os carros se tornaram verdadeiras fontes de sangue que escorriam das ferragens interminavelmente. Rapidamente as almas começaram a surgir ao lado dos destroços e de seus corpos retorcidos, confusas certamente afinal ninguém entenderia ao ver-se repentinamente fora do carro que dirigia e agora totalmente destruído.
- Ei, o que é isso? Aconteceu... um acidente? - um senhor trajando vestes sociais se aproximava de um adolescente que observava seu braço decepado no chão.
- Não... Não sei - sem olhar para ele, o garoto demonstrava estar tão confuso quanto ele.
- Mãe! Mãe!!! - uma garotinha caminhava aos prantos por entre os veículos procurando sua mãe - Mãe!!!
Um evento dessas proporções e com tantas almas a perambular certamente atrairia a atenção dos deuses da morte, isso se outros hollows também não surgissem atraídos pela fome. Como se uma bola de agulhas me descesse pela garganta, sentia-a me perfurando internamente, uma sede descomunal me atormentava deixando-me um único caminho a seguir. Saltei da estrutura e caí sobre um dos automóveis, o som do metal se amassando e dos vidros estourando direcionou todos os olhares para minha presença. Cientes ou não de que estavam mortos, qualquer pessoa saberia que um monstro de forma repugnante surgindo do nada não podia ser boa coisa. Agora pelo menos sabiam que havia algo pior do que conheciam.
Imediatamente começaram a gritar e a correr na direção oposta, porém, aquilo só tornava o que deveria ser uma rápida refeição em uma caçada. Corri em direção ao senhor que se jogava no chão tentando rastejar para baixo de um dos carros, antes que se ocultasse completamente lhe agarrei por um dos pés e o puxei brutalmente.
- Misericórdia! Não!!! - o lancei para cima e ao cair o abocanhei, devorando boa parte de seu torso na primeira mordia.
Não demorei em consumir o restante e continuei minha caçada. O garoto tentava escalar a carreta para passar ao outro lado, mas no meio da escalada foi golpeado pela minha cauda que o arremessou ao chão. Com outro bote lhe mordi pelas pernas sacudindo-o no ar e com outro movimento o engoli por inteiro. Sentia gradativamente uma satisfação crescendo em meu interior, falta pouco para saciar minha sede. Meu rugido ecoou pela ponte, se alguma alma ainda não sabia da minha presença com certeza agora estava ciente.
- Kin, minha filha!
Voltando-me para trás observei a garotinha de outro momento abraçando fortemente uma mulher que estava ajoelhada, finalmente havia encontrado sua mãe... Pelo menos estariam juntas no último momento. Com passos pesados avançava em sua direção, ela me observava assustada, porém, nada fazia para fugir. Sabia que essa possibilidade não existia por isso apenas encostou o rosto da filha contra o peito e começou a falar.
- Calma querida... Daqui a pouco estaremos em paz - suas lágrimas caiam sobre os cabelos de Kin e os acariciava ternamente - Saita, saita churippu no hana ga. Naranda, naranda aka, shiro kiro...
Meus dentes partiram facilmente ambas ao meio e engoli prontamente a primeira parte, lhe devorando os membros inferiores em seguida. Muitas outras almas ainda estavam pelo louco fugindo de mim, contudo, do outro lado da ponte já podia vê-lo, com aquelas vestes negras e uma lãmina na mão. Não era um momento propício para um confronto e a sede já não me atormentava, pondo força nas pernas saltei da ponte mergulhando novamente das águas dos rios. Ia afundando para escuridão, levando aquelas almas para o esquecimento eterno.